FACULDADE SAVONITTI

FILOSOFIA DO DIREITO
Home
ALUNOS
GRADE
FOTOS
DOWNLOAD
SOCIOLOGIA
FILOSOFIA DO DIREITO
CONTATOS

FILOSOFIA DO DIREITO

DOCENTE: PEDRO R. CAMPANINI

SUMÁRIO

Capítulo I – Do mito à razão

02

Capítulo II – Noção Preliminar de Filosofia

06

Capítulo III – Filosofia do Direito na Grécia

09

Capítulo IV – Filosofia do Direito em Roma

19

Capítulo V – Filosofia do Direito na Idade Média

21

Capítulo VI – Filosofia do Direito do Renascimento até o Século XIX

27

Capítulo VII – Positivismo Jurídico

37

Capítulo VIII – Carlos Cossio

42

Capítulo IX - Miguel Reale

43

Textos

46

 

ARARAQUARA


2

CAPÍTULO I

DO MITO À RAZÃO

Filosofar é ver o relâmpago como fenômeno natural

e não como vingança ou ameaça divina.

I - PANORAMA HISTÓRICO E CULTURAL

- A civilização grega se desenvolveu na Península Balcânica, a mais oriental do sul da Europa, rodeada por inúmeras ilhas. Com relevo montanhoso, grupos humanos isolados e autônomos foram se criando: as cidades-estados (polis).

- A sociedade grega era organizada em monarquias, com caráter divino; e religião politeísta baseada na mitologia. O período era teocêntrico.

- O crescimento populacional, a procura de terras férteis e o comércio incentivaram a navegação.

- Nos séculos VI e V a.C., as polis alcançaram o apogeu econômico, político e cultural. Neste período surge o confronto entre mito e filosofia. Podem ser apontadas, com maior profundidade, as seguintes condições históricas que permitiram o conflito entre mito e filosofia:

            �� as viagens marítimas: permitiram aos gregos descobrir que os locais que os mitos diziam habitados por deuses, titãs e heróis eram, na verdade, habitados por outros seres humanos; e que as regiões dos mares que os mitos diziam habitados por monstros e seres fabulosos não possuíam tais personagens. As viagens produziram o desencantamento ou a desmistificação do mundo, que passou, assim, a exigir uma explicação sobre sua origem, explicação que o mito já não podia oferecer;

            �� o surgimento da vida urbana: com predomínio do comércio e do artesanato, dando desenvolvimento a técnicas de fabricação e de troca, diminui o prestígio das famílias da aristocracia proprietária de terras, por quem e para quem os mitos foram criados; além disso, o surgimento de uma classe de comerciantes ricos, que precisava encontrar pontos de poder e de prestígio para suplantar o velho poderio da aristocracia de terras e de sangue (as linhagens constituídas pelas famílias), fez com que se procurasse o prestígio pelo patrocínio e estímulo às artes, às técnicas e aos conhecimentos, favorecendo um ambiente no qual a Filosofia poderia surgir.

            �� a invenção da política: introduz três aspectos novos e decisivos para o nascimento da Filosofia:

           1. A idéia da lei como expressão da vontade de uma coletividade humana que decide por si mesma e não por ordens divinas.

           2. O surgimento de um espaço público, que faz aparecer um novo tipo de palavra ou de discurso, diferente daquele que era proferido pelo mito, ou seja, quem resolve as questões políticas são os homens e não profetas que “ditam” as palavras dos deuses.

           3. A política estimula o pensamento e o discurso público, que são transmitidos e discutidos. A idéia de um pensamento que todos podem compreender e discutir, que todos podem comunicar e transmitir, é fundamental para a Filosofia.

 

- Durante um longo período a mitologia representou a fonte exclusiva de explicação para a existência do homem, suas relações sociais e sobre a organização do mundo.

- O mito é uma narrativa imaginária que estrutura e organiza de forma criativa as crenças culturais. Os atores de tais lendas são os deuses e, muitas vezes, seus relacionamentos com os seres humanos. Apesar da fantasia dos mitos, há uma forte carga de sabedoria e conhecimento das paixões humanas, dos problemas existenciais e da necessidade de leis que possibilitem a vida comum. Além disso, dada a falta de qualquer conhecimento científico, os mitos explicavam os fenômenos naturais com alguma consistência.

- Devido ao desenvolvimento e aos contatos culturais com outros povos, decorrentes do comércio e da navegação, os gregos cultos buscaram explicações mais universais para justificar o universo e as


3

instituições humanas. Os novos conceitos tinham por base a razão, substituindo assim, lentamente, os mitos.

II - Os principais períodos da Filosofia

1. Filosofia antiga (século VI a.C. ao século VI d.C.)

Compreende os quatro grandes períodos da Filosofia greco-romana, indo dos pré-socráticos aos grandes sistemas do período helenístico.

2. Filosofia patrística (século I ao século VII)

Inicia-se com as Epístolas de São Paulo e o Evangelho de São João e termina no século VIII, quando teve início a Filosofia medieval.

A patrística resultou do esforço feito pelos dois apóstolos intelectuais (Paulo e João) e pelos primeiros Padres da Igreja para conciliar a nova religião - o Cristianismo - com o pensamento filosófico dos gregos e romanos, pois somente com tal conciliação seria possível convencer os pagãos da nova verdade e converte-los a ela. A Filosofia patrística liga-se, portanto, à tarefa religiosa da evangelização e à defesa da religião cristã contra os ataques teóricos e morais que recebia dos antigos.

A patrística foi obrigada a introduzir idéias desconhecidas para os filósofos greco-romanos: a idéia de criação do mundo, de pecado original, de Deus como trindade una, de encarnação e morte de Deus, de juízo final ou de fim dos tempos e ressurreição dos mortos, etc. Precisou também explicar como o mal pode existir no mundo, já que tudo foi criado por Deus, que é pura perfeição e bondade. Introduziu a idéia de "homem interior", isto é, da consciência moral e do livre-arbítrio, pelo qual o homem se torna responsável pela existência do mal no mundo.

A verdade da Bíblia representa para a patrística dogmas divinos, irrefutáveis e inquestionáveis, pois são revelações de Deus.

3. Filosofia medieval (século VIII ao século XIV)

Abrange pensadores europeus, árabes e judeus. É o período em que a Igreja Romana dominava a Europa, ungia e coroava reis, organizava Cruzadas à Terra Santa e criava, à volta das catedrais, as primeiras universidades ou escolas.

E, a partir do século XII, por ter sido ensinada nas escolas, a Filosofia medieval também é conhecida com o nome de Escolástica.

A Filosofia medieval teve como influências principais Platão e Aristóteles, embora o Platão que os medievais conhecessem fosse o neoplatônico (vindo da Filosofia de Plotino, do século VI d.C.), e o Aristóteles que conhecessem fosse aquele conservado e traduzido pelos árabes. Além destes, o pensamento de Santo Agostinho também influenciou bastante.

Durante esse período surge propriamente a Filosofia cristã, que é, na verdade, a teologia. Um de seus temas mais constantes são as provas da existência de Deus e da alma, isto é, demonstrações racionais da existência do infinito criador e do espírito humano imortal.

A diferença e separação entre infinito (Deus) e finito (homem, mundo), a diferença entre razão e fé (a primeira deve subordinar-se à segunda), a diferença e separação entre corpo (matéria) e alma (espírito), O Universo como uma hierarquia de seres, onde os superiores dominam e governam os inferiores (Deus, arcanjos, anjos, alma, corpo, animais, vegetais, minerais), a subordinação do poder temporal dos reis e barões ao poder espiritual de papas e bispos.

Os teólogos medievais mais importantes foram: Abelardo, Duns Scoto, Escoto Erígena, Santo Anselmo, Santo Tomás de Aquino, Roger Bacon.

4. Filosofia da Renascença (século XIV ao século XVI)


4

É marcada pela descoberta de obras de Platão desconhecidas na Idade Média, de novas obras de Aristóteles, bem como pela recuperação das obras dos grandes autores e artistas gregos e romanos.

São três as grandes linhas de pensamento que predominavam na Renascença:

- A idéia da Natureza como um grande ser vivo; o homem faz parte da Natureza como um microcosmo e pode agir sobre ela através da magia natural, da alquimia e da astrologia, pois o mundo é constituído por vínculos e ligações secretas entre as coisas; o homem pode, também, conhecer esses vínculos e criar outros, como um deus.

- Aquela originária dos pensadores florentinos, que valorizava a vida ativa, isto é, a política, e defendia os ideais republicanos das cidades italianas contra o Império Romano-Germânico, isto é, contra o poderio dos papas e dos imperadores. Na defesa do ideal republicano, os escritores resgataram autores políticos da Antigüidade, historiadores e juristas, e propuseram a "imitação dos antigos" ou o renascimento da liberdade política, anterior ao surgimento do império eclesiástico.

- Aquela que propunha o ideal do homem como construtor de seu próprio destino, tanto através dos conhecimentos (astrologia, magia, alquimia), quanto através da política (o ideal republicano), das técnicas (medicina, arquitetura, engenharia, navegação) e das artes (pintura, escultura, literatura, teatro).

Todas estas teorias sofreram influência positiva das grandes descobertas marítimas, que garantiam ao homem o conhecimento de novos mares, novos céus, novas terras e novas gentes, permitindo-lhe ter uma visão crítica de sua própria sociedade.

Esses conhecimentos culturais e políticos levaram a críticas profundas à Igreja Romana, culminando na Reforma Protestante, baseada na idéia de liberdade de crença e de pensamento. À Reforma a Igreja respondeu com a Contra-Reforma e com o aumento do poder da Inquisição.

Os nomes mais importantes desse período são: Dante, Marcílio Ficino, Giordano Bruno, Campannella, Maquiavel, Montaigne, Erasmo, Tomás Morus, Jean Bodin, Kepler e Nicolau de Cusa.

5. Filosofia moderna (século XVII a meados do século XVIII)

Período conhecido como o Grande Racionalismo Clássico. Predomina a idéia de conquista científica e técnica de toda a realidade, a partir da explicação mecânica e matemática do Universo e da invenção das máquinas, graças às experiências físicas e químicas.

Existe também a convicção de que a razão humana é capaz de conhecer a origem, as causas e os efeitos das paixões e das emoções e, pela vontade orientada pelo intelecto, é capaz de governá-las e dominá-las, de tal modo que a vida ética pode ser plenamente racional.

A mesma convicção orienta o racionalismo político, isto é, a idéia de que a razão é capaz de definir para cada sociedade qual o melhor regime político e como mantê-lo racionalmente.

Os principais pensadores desse período foram: Francis Bacon, Descartes, Galileu, Pascal, Hobbes, Espinosa, Leibniz, Malebranche, Locke, Berkeley, Newton, Gassendi.

6. Filosofia da Ilustração ou Iluminismo (meados do século XVIII ao começo do século XIX)

Esse período também crê nos poderes da razão, chamada de As Luzes (por isso, o nome Iluminismo).

O Iluminismo afirma que:

- pela razão, o homem pode conquistar a liberdade e a felicidade social e política (foi decisiva para as idéias da Revolução Francesa de 1789);

- a razão é capaz de evolução e progresso, e o homem é um ser perfectível. A perfectibilidade consiste em liberar-se dos preconceitos religiosos, sociais e morais, em libertar-se da superstição e do medo, graças ao conhecimento, às ciências, às artes e à moral;

- o aperfeiçoamento da razão se realiza pelo progresso das civilizações, que vão das mais atrasadas (também chamadas de "primitivas" ou "selvagens") às mais adiantadas e perfeitas (as da Europa Ocidental);


5

- há diferença entre Natureza e civilização, isto é, a Natureza é o reino das relações necessárias de causa e efeito ou das leis naturais universais e imutáveis, enquanto a civilização é o reino da liberdade e da finalidade proposta pela vontade livre dos próprios homens, em seu aperfeiçoamento moral, técnico e político.

Nesse período há grande interesse pelas ciências que se relacionam com a idéia de evolução (biologia); com as artes (na medida em que elas são as expressões do grau de progresso de uma civilização), e pela compreensão das bases econômicas da vida social e política, surgindo uma reflexão sobre a origem e a forma das riquezas das nações, com uma controvérsia sobre a importância maior ou menor da agricultura e do comércio, controvérsia que se exprime em duas correntes do pensamento econômico: a corrente fisiocrata (a agricultura é a fonte principal das riquezas) e a mercantilista (o comércio é a fonte principal da riqueza das nações).

Os principais pensadores do período foram: Hume, Voltaire, D’Alembert, Diderot, Rousseau, e Kant.

7. Filosofia contemporânea

Abrange o pensamento filosófico que vai de meados do século XIX e chega aos nossos dias. Esse período, por ser o mais próximo de nós e estar em construção atualmente, parece ser o mais complexo e o mais difícil de definir, pois as diferenças entre as várias filosofias ou posições filosóficas nos parecem muito grandes porque as estamos vendo surgir diante de nós.


6

CAPÍTULO II

NOÇÃO PRELIMINAR DE FILOSOFIA

“Não se ensina Filosofia, se ensina a filosofar”. Kant

FILOSOFIA

            o Filo - Do grego philos = amigo, atraído por, que tem afinidade com

            o Sofia - Do grego sophia = saber, ciência, sabedoria

            o Conclusão: significa amizade ou amor pela sabedoria

 

- Os primeiros filósofos gregos não concordaram em ser chamados sábios, por terem consciência do muito que ignoravam. Preferiram ser conhecidos como amigos da sabedoria, ou seja — filósofos.

- Aristóteles (384-322 a.C.), repetindo ensinamento platônico, dizia que a Filosofia começou com a perplexidade, ou melhor, com a atitude de assombro do homem perante a natureza, em um crescendo de dúvidas, a começar pelas dificuldades mais aparentes.

- Os mitos: O homem passou a filosofar no momento em que se viu cercado pelo problema e pelo mistério, adquirindo consciência de sua dignidade pensante.

- Não é preciso seguir um sistema de Filosofia, nem ser capaz de dizer em que ano escreveu Kant cada um de seus estudos, para possuir atitude filosófica.

- Atitude filosófica: é própria de quem saiba captar e renovar os problemas universais sobre o cosmos e sobre a vida, procurando satisfazer às exigências atuais, significantes por novos e por velhos problemas situados em diversos ciclos histórico-culturais.

- A Filosofia deseja saber os princípios e causas em seus estudos, ou seja, como começam e como terminam ou se concretizam os fatos ou atos = sentido de universalidade (saber o todo).

- Busca pela verdade. Há, no entanto, uma verdade absoluta?

- Por isso quem passa a estudar Filosofia no plano da História fica, à primeira vista, desapontado, quando não cético, por encontrar um tumultuar de respostas, uma multiplicação de sistemas e de teorias. Surge, então, logo a pergunta:

            - Por que estudar Filosofia, se os filósofos jamais conseguem se entender?

            - Qual a vantagem ou a utilidade da Filosofia, se os maiores pensadores nunca chegam a concordância sobre pontos fundamentais?

            o A vantagem é a busca incessante pela verdade, pois de outra forma desistiríamos do conhecimento, viveríamos com “verdades” estipuladas por outras pessoas.

            o O conhecimento é sempre limitado pelo espaço e pelo tempo, bem como pelo ponto de vista de cada um.

 

- O que distingue, porém, a Filosofia é que as perguntas formuladas por Platão, Aristóteles ou Kant, não perdem a sua atualidade, visto possuírem um significado universal, que ultrapassa os horizontes dos ciclos históricos => as perguntas filosóficas interessam a todos, pois tratam do próprio homem (como pode um ser humano não se interessar por sua existência).

- Para Marilena Chauí, a utilidade da filosofia assim se conceitua: “Se abandonar a ingenuidade e os preconceitos do senso comum for útil; se não se deixar guiar pela submissão à idéias dominantes e aos poderes estabelecidos for útil; se buscar compreender a significação do mundo, da cultura, da história for útil; se conhecer o sentido das criações humanas nas artes, nas ciências, e na política for útil; se dar a cada um de nós e à nossa sociedade os meios para serem conscientes de si e de suas ações numa prática que deseja a liberdade e a felicidade para todos for útil, então podemos dizer


7

que a Filosofia é o mais útil de todos os saberes de que os seres humanos são capazes”. (Convite à filosofia, Ática: 1999, p. 18).

FILOSOFIA DO DIREITO (Jusfilosofia)

- Filosofia do Direito: não é disciplina jurídica, mas é a própria Filosofia voltada para uma ordem de realidade, que é a "realidade jurídica".

- Nem mesmo se pode afirmar que seja Filosofia especial, porque é a Filosofia, na sua totalidade, na medida em que se preocupa com algo que possui valor universal, a experiência histórica e social do direito.

- O direito é realidade universal. Onde quer que exista o homem, aí existe o direito como expressão de vida e de convivência.

- É exatamente por ser o direito fenômeno universal que é ele suscetível de indagação filosófica. A Filosofia não pode cuidar senão daquilo que tenha sentido de universalidade.

- Na Filosofia do Direito faz-se reflexão sobre o problema jurídico em suas raízes, independentemente de preocupações imediatas de ordem prática.

- O jurista constrói a sua ciência partindo de certos pressupostos, que são fornecidos pela lei e pelos códigos.

- Quando o advogado invoca o texto apropriado da lei, fica relativamente tranqüilo, porque a lei constitui ponto de partida seguro para o seu trabalho profissional; da mesma forma, quando um juiz prolata a sua sentença e a apóia cuidadosamente em textos legais, tem a certeza de estar cumprindo sua missão de ciência e de humanidade, porquanto assenta a sua convicção em pontos ou em cânones que devem ser reconhecidos como obrigatórios.

- O filósofo do direito, ao contrário, converte tais pontos de partida em problemas, perguntando:

                o Por que o juiz deve apoiar-se na lei?

                o Quais as razões lógicas e morais que levam o juiz a não se revoltar contra a lei, e a não criar solução sua para o caso que está apreciando, uma vez convencido da inutilidade, da inadequação ou da injustiça da lei vigente?

                o Por que a lei obriga?

                o Como obriga?

                o Quais os limites lógicos da obrigatoriedade legal?

 

- A missão da Filosofia do Direito é, portanto, de crítica da experiência jurídica, no sentido de determinar as suas condições transcendentais (condições que servem de fundamento à experiência jurídica tornando-a possível).

- Para tanto a Filosofia do Direito precisa saber (através dos pressupostos jurídicos, descobrir os fundamentos do Direito):

                o Quem governa a vida jurídica?

                o O que é que condiciona o trabalho do jurista?

                o Quais as bases da Ciência do Direito e quais os títulos éticos da atividade do legislador?

 

- A Filosofia é um conhecimento que converte em problema os pressupostos das ciências. É, portanto, sempre de natureza crítica.

- Delineamos, portanto uma noção geral do que entendemos por Filosofia, como estudo das condições últimas, dos primeiros princípios que governam a realidade natural e o mundo moral, ou compreensão crítico-sistemática do universo e da vida.

Propostas da Filosofia do Direito:


8

            - Disciplina tendente a estudar a justiça (jusnaturalistas)

            - Disciplina tendente a estudar o dever-ser, verificando sua autonomia existencial (positivistas)

            - Disciplina tendente a estudar e criticar o método jurídico utilizado cientificamente pelos juristas (formalistas)

            - Disciplina tendente a estudar questões jurídicas históricas, assim como contribuir para o aperfeiçoamento do direito positivo (normativistas)

            - Disciplina tendente a estudar os fatos jurídicos (sociologistas)

 

Metas da Filosofia do Direito:

            - proceder à crítica das práticas, das atitudes e atividades dos operadores do Direito

            - avaliar e questionar a atividade legiferante, bem como oferecer suporte reflexivo ao legislador

            - investigar as causas da desestruturação, do enfraquecimento ou da ruína de um sistema jurídico

            - investigar a eficácia dos institutos jurídicos, sua atuação social e seu compromisso com as questões sociais, seja no que tange a um indivíduo, a uma população definida, ou a temas universais

            - esclarecer e definir a finalidade (teleologia) do Direito e seus aspectos valorativos

            - por meio da crítica conceitual institucional, valorativa, política e procedimental, auxiliar o juiz no processo decisório

            - difundir a mentalidade da Justiça como fundamento e finalidade do Direito

            - discutir as bases axiológicas (valores morais), econômicas e estruturais que delineiam o Direito

            - denunciar ideologias que orientam a cultura da comunidade jurídica.

 

CONCEITOS DE FILOSOFIA DO DIREITO

Miguel Reale:

“Perquirição permanente e desinteressada das condições morais, lógicas e históricas do fenômeno jurídico e da Ciência do Direito” (Lições Preliminares de Direito, p. 14)

Eduardo C. B. Bittar:

“A Filosofia do Direito é um saber crítico a respeito das construções jurídicas erigidas pela Ciência do Direito e pela própria práxis do Direito. Mais que isso, é sua tarefa buscar fundamentos do Direito, seja para cientificar-se de sua natureza, seja para criticar o assento sobre o qual se fundam as estruturas do raciocínio jurídico, provocando, por vezes, fissuras no edifício que por sobre as mesmas se ergue.” (Curso de Filosofia do Direito, 2004, p. 50).

APLICAÇÃO DA FILOSOFIA DO DIREITO:

            1. Direito: uma ação humana para um fim imediato

            2. Filosofia do Direito: observação => visão do todo para estabelecer os meios de decisão para tomada das ações -> re-pensar.

            3. Não há ação sem decisão (reflexão leva a decisão).

            4. A filosofia investiga os fundamentos da decisão, aprofunda os conhecimentos para melhor embasar as decisões.

            5. Com a reflexão a ação é mais perfeita, portanto, as linhas do Direito tendem a evoluir.


9

CAPÍTULO III

FILOSOFIA DO DIREITO NA GRÉCIA

Na Grécia Antiga, pela primeira vez, o direito deixa de ser objeto exclusivo de sacerdotes e monarcas, para ser discutidos por filósofos e juristas. Pela primeira vez o material jurídico desvencilha-se de traços religiosos, morais e políticos.

1 - A ESCOLA PITAGÓRICA

- Fundamentada em Pitágoras de Samos, o núcleo dos estudos eram os números, que são a essência e princípio dos seres. Deus é o número perfeito e dele tudo emana.

- Para o direito, a filosofia dos números teve importância ao enxergar a Justiça como uma equação aritmética, ou seja, só há justiça quando há proporção, igualdade. Só há justiça quando há uma relação aritmética de igualdade entre dano e reparação, prestação e contraprestação.

- Diante disso os pitagóricos representavam a Justiça por um quadrado (pensando na exata igualdade dos quatro lados). Portanto, para eles, a Justiça exige, antes de qualquer coisa, a igualdade.

- Tal conceito influenciou Aristóteles na criação dos conceitos de Justiça Distributiva, Corretiva e Comutativa. Influenciou Dante Alighieri na definição de direito baseada na proporção. Também influenciou Beccaria quando este definiu que há necessidade de proporcionalidade entre o delito e a pena.

2 - PERÍODO PRÉ-SOCRÁTICO E OS SOFISTAS

- Inicialmente os filósofos gregos estudavam a natureza e seus fenômenos, o surgimento da vida, o elemento vital. Eram conhecidos como filósofos da natureza ou pré-socráticos.

- Por volta de 450 a.C., Atenas se transformou no centro cultural do mundo grego. A partir dessa época, a filosofia tomou um novo rumo.

- O centro dos estudos se deslocou para o homem e para sua posição na sociedade = antropocentrismo.

- Nessa época desenvolveu-se a democracia1 e, portanto, a retórica (a arte de bem falar) era muito importante para as discussões em assembléias e tribunais, e necessitava estudo e conhecimento para ser bem desempenhada.

- Com isso, um grupo de mestres e filósofos se concentrou em Atenas. Eram os sofistas: pessoas estudadas que ganhavam a vida ensinando aos cidadãos (homens de alto nível social).

- Os sofistas2, assim como os filósofos da natureza, eram contrários à mitologia.

- Os sofistas achavam que jamais alguém seria capaz de encontrar respostas para muitas questões, como por exemplo, os mistérios da natureza e do universo. É o chamado ceticismo, uma prevenção diante da possibilidade de descobrir a verdade.

- Os sofistas eram pessoas muito viajadas, conheciam diversos sistemas de governo, diversas culturas, com isso começaram a discutir o que seria natural e o que seria criado pela sociedade. Foi o início da crítica social.

1 Democracia = Sentido literal �� demo = povo + cracia = poder = poder do povo

�� A palavra democracia surgiu na Grécia, tendo seu período áureo em Atenas. Como era a democracia ateniense: havia 240 mil habitantes, desse total 150 mil eram escravos (s/ direitos políticos) e 60 mil, mulheres e crianças (s/ direitos políticos), dos 30 mil restantes (os homens), a média de votantes era de 6 mil, pois muitos eram menores de idades e muitos também faltavam às votações. Ainda assim, as leis diziam que o povo inteiro deveria decidir. Podemos concluir que a democracia plena nunca existiu.

2 Os sofistas cobravam para ensinar. Por isso a palavra “sofisma” ganhou sentido pejorativo: Argumento aparentemente válido, mas, na realidade não conclusivo, que supõe a má-fé por parte de quem o apresenta. Parte de premissas verdadeiras, e, apesar de chegar a uma conclusão inadmissível, é produto de regras formais de raciocínio, não podendo ser refutado.


10

3 Muito tempo depois Aristóteles disse que o fogo, por ser fenômeno da natureza, arde de forma igual em todos os lugares. No entanto, o Direito não se apresenta igual em culturas diferentes.

- Eles demonstraram que não existia um sentimento natural de pudor, pois as pessoas não nasciam com o sentimento de vergonha, não era algo inato, pois se assim fosse, em todos os lugares as pessoas achariam as mesmas coisas como certas. Com isso percebemos que nossa moral é determinada pela sociedade.

- Os sofistas afirmaram que não havia regras absolutas, com isso os governantes ficaram muito irritados, pois eles faziam as regras e diziam que os deuses queriam dessa forma, pois era a Justiça Absoluta.

- Segundo Protágoras (487-420 a.C.) “o homem é a medida de todas as coisas”.

- Com isso ele quis dizer que o certo e o errado, o bem e o mal sempre tinham de ser avaliados em relação às necessidades do homem.

- Aí está o mérito da sofística: libertar o homem dos conceitos mitológicos, colocando-o no centro do pensamento.

- Por esta forma de raciocínio, os sofistas passaram a entender os valores como relativos e não mais absolutos (de definição divina). Assim, a Justiça passou a ser vista como um valor relativo, a serviço dos interesses humanos.

- Ao analisar as leis, os sofistas perceberam que o homem era o princípio e a causa de si mesmo e não a natureza: quem define as leis são os homens, não as divindades.

- Caso fosse a natureza que definisse as leis, elas seriam iguais em todos os lugares do mundo3, portanto, é possível concluir que o homem define, conforme seus interesses, o certo e o errado. As leis são atos humanos e racionais que se constituem no centro da sociedade, por causa das necessidades sociais e através da discussão comum.

- Trasímaco disse que a justiça é vantagem para quem domina e não para quem é dominado. Com isso os sofistas relativizaram o conceito de justiça, igualando-o ao de lei: é justo o que está na lei. Com a relativização da justiça cria-se um debate para toda a história do Direito: a Justiça é relativa ou absoluta, muda ou não com o tempo e espaço?

3 - SÓCRATES (470-399 a.C.)

3.1 - Método Socrático

- Diferentemente dos sofistas, queria demonstrar que algumas normas são absolutas e de validade universal.

- Sócrates era contemporâneo dos sofistas, mas diferentemente deles nunca cobrou nada por seus ensinamentos. Ele se afirmava como um verdadeiro amante da sabedoria, e que todas as pessoas poderiam aprender e chegar ao seu objetivo: sabedoria.

- O ponto central da atuação de Sócrates é que ele não queria propriamente passar seus conhecimentos aos demais. No início de seus diálogos ele passava a impressão ao outro interlocutor de que queria aprender e, discutindo e dialogando, chegava ao ponto desejado. Geralmente, no começo das conversas ele só fazia perguntas, como se não soubesse nada. Durante a conversa levava seu interlocutor a perceber a fragilidade do próprio ponto de vista, que com isso acabava reconhecendo o certo e o errado e, por muitas vezes mudava de opinião.

- A mãe de Sócrates era parteira e ele se comparava a uma parteira, pois assim como ela que só ajuda e indica o caminho para o bebê nascer, ele só ajudava a pessoa a perceber o conhecimento que tinha dentro de si, pois o verdadeiro conhecimento tinha de vir de dentro. Ele achava que as pessoas poderiam entender as verdades filosóficas usando sua própria razão.

- Sócrates entendia que a alma era imortal e por isso ela acumulava o conhecimento de várias vidas, então quando aprendemos algo, só estamos relembrando. Quando nascemos, ninguém nos ensina a usarmos nossos sentidos, pois já vivemos outras vezes. Quem é bom já nasceu bom, pois já tivemos experiências em outras vidas que nos dão essa capacidade.


11

- Como Sócrates se fingia de ignorante para que as pessoas pudessem “parir” seus conhecimentos, criou-se o termo “ironia socrática” e maiesese (parto do conhecimento).

- Muitas vezes, pessoas de maior poder aquisitivo e que se consideravam inteligentes, eram levadas a mudar de opinião após dialogarem com Sócrates, isso às vezes acontecia em frente de outras pessoas, o que para os arrogantes era uma grande humilhação.

- Mas Sócrates não fazia isso por pura vontade, dizia ele que ouvia dentro de si uma voz divina, que lhe pedia para acordar as pessoas de sua ignorância. A essa voz ele dava o nome de “daimon”.

- Para procurar os conceitos universais o método socrático, baseado no diálogo, está assentado em dois passos fundamentais:

1 - Ironia. Sócrates começa por solicitar ao seu interlocutor que defina um dado conceito (O que é o Bem? a Justiça? a Retórica?). Aceita qualquer definição como ponto de partida, para em seguida formular um conjunto de questões em torno da mesma, mostrando as suas limitações. Chama-se ironia a este passo, porque nos Diálogos de Platão, Sócrates, finge ignorar as respostas que procura.

2 - Maiêutica. Confrontado com as limitações das suas definições, o interlocutor, acaba por reconhecer as limitações do seu próprio saber. É então convidado a reformular a resposta anterior, dando uma definição mais ampla, na direção da universalidade. Maiese = parto.

3.2 - Intelectualismo Moral

- Quem sabe o que é certo acaba fazendo o que é certo: Só os ignorantes praticam o mal

- Sócrates recusa uma atitude simplesmente teórica perante o saber (atitude característica dos sofistas). Parte do princípio que quem verdadeiramente procura o Bem, só pode viver segundo o Bem.

- Diferentemente dos sofistas, Sócrates entendia que a razão definia o certo e o errado e não a sociedade.

- Para ele quem sabe o que é bom acaba fazendo o bem.

- Sócrates achava impossível alguém ser feliz se agisse contra suas próprias convicções, e sendo assim, quem sabe como ser feliz certamente tentará fazê-lo.

- A virtude identifica-se com o conhecimento, ou dito de outro modo: Saber e Moralidade são o mesmo, e estão indissociavelmente ligados. O único que comete o mal é o ignorante, aquele que conhece o bem só pode praticar o bem.

- O meio único de alcançar a felicidade ou semelhança com Deus, fim supremo do homem, é a prática da virtude.

- Sócrates reconhece também, acima das leis mutáveis e escritas, a existência de uma lei natural independente do arbítrio humano, universal, fonte primordial de todo direito positivo, expressão da vontade divina promulgada pela voz interna da consciência.

3.3 - A importância das leis

- Sócrates pregava a obediência às leis.

- Via no racionalismo sofista (recusar cumprimento às leis dado o ceticismo de seu pensamento e sua negação às leis de “caráter” divino) um perigo, pois este levava ao ceticismo, que desorientava a noção que se deveria ter de moral e de bem.

- Em um diálogo que manteve com Hípias — o qual encontra-se no Capítulo IV do Livro IV de Memoráveis, escrito por Xenofonte — Sócrates fora questionado sobre sua concepção de justiça e respondeu que julgava desnecessário dizer com palavras o que demonstrava com o seu comportamento. Como não estivesse satisfeito com a resposta, Hípias pergunta a Sócrates o que seria justo e este responde: "eu digo que o que é legal é justo". A priori, essa resposta parece ter um cunho altamente positivista, mas se analisarmos as concepções socráticas acerca das leis veremos em Sócrates um gérmen do jusnaturalismo, posto que ele acreditava que havia, além das leis escritas (humanas), leis que valiam para todos os homens e que eram de origem divina.

- Ao ser condenado injustamente, Sócrates manteve-se fiel a seus ensinamentos, posto que entendia que "era preciso que os homens bons cumpram as leis más para que os homens maus cumpram as


12

leis boas". Em conclusão, a ordem e paz social dependem das atitudes humanas em respeitar ou não as leis do Estado.

3.4 – Morte

- Depois de uma vida inteira dedicada a interrogar os seus concidadãos, em obediência a uma voz interior (daimon) é acusado (399 a.C.) de corromper os jovens contra a religião e as leis da cidade, bem como por não acreditar na existência dos deuses.

- Por uma maioria apertada foi considerado culpado e condenado à morte.

- Ele poderia ter pedido clemência e se livrado da pena capital, bastando apenas deixar a cidade de Atenas. Mas ele não fez isso, apesar do apelo de todos seus familiares e amigos, entre eles Platão. Não fez porque entendia que havia feito em toda sua vida o que a voz divina lhe pedia, o que sua consciência lhe pedia, havia feito tudo pelo bem do Estado e de seus habitantes, não poderia então, pedindo clemência, negar tudo que havia defendido em vida.

- Além disso, para Sócrates a ordem das leis deve ser seguida, não importando se são justas ou não, devendo prevalecer a ética social sobre a ética individual. O Direito aparece assim como um elemento de coesão social, que visa realizar o Bem Comum. Dessa forma, a vontade humana não pode derrogar a ordem jurídica.

- Essa história encontra-se na obra “Apologia de Sócrates”, escrita por Platão, que conta desde o julgamento até o momento em que Sócrates bebeu o cálice de cicuta.

- Sócrates não via problema na morte, pois acreditava na eternidade da alma, e acreditava também que havia cumprido muito bem seu papel, por isso sua alma seria mandada a um lugar muito bom.

4 - PLATÃO (427-347 a.C.)

- Os interesses de Platão estavam em tudo aquilo que é eterno e imutável (como Sócrates) e em tudo aquilo que flui (como os pré-socráticos, os sofistas).

- Platão se interessava pelo eterno e imutável na natureza (como os filósofos da natureza) e também na moral e na sociedade (como Sócrates e os sofistas).

- Assim como outros filósofos Platão queria estabelecer certas verdades imutáveis: o que é eternamente verdadeiro, eternamente belo, eternamente bom.

- As preocupações filosóficas devem ser interessantes para sempre, para todas as pessoas.

4.1 Mundo da idéias

- Os filósofos da natureza (Empédocles e Demócrito) já haviam chamado a atenção para o fato de que, apesar de todos os fenômenos da natureza fluírem, havia algo que nunca se modificava, para o primeiro os quatro elementos (água, terra, fogo e ar) e para o segundo os átomos. Platão também se dedicou a este problema, mas de forma bem diferente.

- Para Platão, tudo que podemos tocar e sentir na natureza flui. Para ele, portanto, não existe um elemento básico que não se desintegre, tudo no mundo dos sentidos está sujeito à corrosão do tempo.

- Diante disso Platão idealizou que o que era eterno e imutável não era um elemento físico básico, mas sim os modelos espirituais ou abstratos, a partir dos quais todos os fenômenos são formados.

- Dessa maneira, Platão percebeu que para todas as coisas existia uma “fôrma”, ou seja, uma idéia perfeita. Existem milhões de seres humanos e são quase sempre diferentes, mas sempre reconhecemos um ser humano, pois sabemos da idéia de ser humano. Platão então separou o mundo dos sentidos do mundo das idéias:

=> o mundo dos sentidos é o que podemos tocar, sentir e nada que existe nesse mundo é eterno, duradouro.

=> o mundo das idéias é onde estão as imagens padrão, imutáveis, eternas que encontramos na natureza.

Mundo Sensível

Mundo Inteligível


13

Objetos sensíveis

Objetos matemáticos

Sombras

Idéias

Ilusão

Conhecimentos matemáticos

Crença

Dialética

Opinião

Ciência

Direito

Justiça

 

4.2 - Platão e a justiça idealizada

- Para os sofistas a razão humana não conseguiria compreender o cosmos. A filosofia deveria refletir sobre a ação humana na terra.

- A questão que os sofistas mais discutiram: qual é a origem das regras jurídicas. Os sofistas são relativistas (cada um tem uma idéia da verdade e pode convencer os outros).

- A Justiça foi um dos principais termos abordados pelos sofistas, já que ela está inserida no campo das ações humanas. Foi tratada de uma maneira convencionalista, não chegando a definir o justo e o injusto como verdades absolutas, apenas prendendo-se às circunstâncias.

- O fundamento de verdade pode ser a natureza ou a convenção. Para os sofistas a verdade é aceita pela teoria do convencionalismo, ditada pelo momento e pelas circunstâncias (tempo/espaço).

- Em contraposição aos sofistas está Sócrates (não é relativista). Para ele existe uma verdade absoluta, única.

- A Justiça aplicada pelos homens é meramente uma convenção e Platão vai buscar a Justiça verdadeira. Mas o que é um homem justo?

- Para a maioria dos Sofistas a origem da justiça está num complô que os mais fracos fisicamente fizeram para deter a força dos mais fortes (CONVENÇÃO). Para Sócrates a justiça não é algo convencional, é fundada na natureza das coisas, da qual se tira a verdade absoluta.

- Platão, como discípulo de Sócrates, seguiu a mesma linha de pensamento de seu mestre e em seus diálogos tentou alcançar a justiça verdadeira, uma vez que a definição da época era meramente convencional.

- Podemos dizer, analisando alguns dos diálogos de Platão, que é da essência da Justiça não prejudicar ninguém, ou seja, o homem que age e prejudica alguém, mesmo que seja um inimigo, é injusto.

- A palavra “prejuízo” é sinônima de “diminuição de valor”, quando prejudicamos alguém, esse alguém se torna menos perfeito, perde valor. Perfeição é objetivo indissociável de Justiça => a Justiça não pode ser imperfeita => a balança de Thêmis não pode pender mais para um lado do que para outro.

- A justiça não prejudica, deve sempre atuar com perfeição, ou seja, sempre ser correta.

- O homem justo deve agir sempre com razão, controlando sua cólera e seu desejo, respeitando o saber do mundo das idéias.

"O homem justo [...] estabelece uma ordem verdadeira no seu interior [...], harmoniza as três partes (razão, cólera, desejo) de sua alma absolutamente como os três termos da escala musical”. República, livro 4.

4.3 - A República

- Nos diálogos da obra A República, Gláucon e Adimanto insistem, através da dialética, na busca pela definição de Justiça. Ambos não são sofistas. Sócrates propõe um desvio, uma metodologia: como não conseguem saber o que é o homem justo, devem ampliar o quadro e passar a analisar a cidade (num quadro maior talvez seja mais fácil de se identificar a justiça)

- Atenas é uma cidade corrompida, já formada. Sócrates (personagem dos diálogos) propõe que se analise uma cidade idealizada, construída em idéia. A maior parte do diálogo se propõe a construir em idéia a cidade. Para Platão a essência do homem e a essência da cidade é a mesma.

- A cidade vai ganhando complexidade e em um dado momento possui três classes. É uma cidade autárquica (auto-suficiente – não precisa de nada além dela):

· artesãos/comerciantes: sustentação econômica. Alma de bronze.


14

· guerreiros/exército: defesa e proteção. Alma de prata.

· Reis: administrar e planejar – SABER – Filosofia. Alma de ouro.

- Para se explicar, Platão utiliza-se de um esquema igual ao do corpo humano:

1 - Cabeça: a razão pertence à cabeça, e dessa forma a cabeça tem a virtude da sabedoria, assim sendo a cabeça representa os governantes.

2 - Peito: a vontade pertence ao peito, e dessa forma a virtude do peito seria a coragem, por isso o peito simboliza os sentinelas, os guardas.

3 - baixo-ventre: o desejo, que deve ser controlado, pertence ao baixo-ventre, por causa desse controle a virtude do baixo-ventre é a temperança ou a moderação, dessa maneira o baixo-ventre representa os trabalhadores que devem ser moderados, dedicando-se ao trabalho.

- Platão dividiu a sociedade ideal em 3 castas: governantes, guerreiros e trabalhadores. Cada casta teria sua função e a desempenharia com perfeição, sendo seus membros educados desde a infância para poderem agir como esperado.

- Todos os indivíduos reúnem razão, coragem e vontade, mas um destes atributos se mostra mais desenvolvido que os demais. E é conforme a manifestação de sua aptidão que deve ser educado o homem. Justo, assim, seria dar-lhe função compatível ao seu mérito.

- Em princípio, o Estado proposto por Platão nos parece extremamente totalitário, mas devemos ponderar que ele vivia numa época totalmente diferente da nossa.

- Quantos às mulheres, Platão achava que elas também poderiam ser governantes, pois tinham a mesma capacidade de raciocínio, de utilização da razão que os homens. Para que as mulheres pudessem governar, bastaria que deixassem os trabalhos de casa e o cuidado com as crianças, e tivessem o mesmo estudo que os homens.

- Platão dizia que um Estado que não educa suas mulheres é como um guerreiro que só treina o braço direito.

- Platão queria abolir a propriedade privada dos governantes e dos sentinelas, evitando assim a corrupção.

- Queria abolir ainda uma parcela da vida familiar, passando a educação infantil para a responsabilidade do Estado, pois era importante demais para ficar na esfera do indivíduo. Platão foi o primeiro a defender a criação de jardins-de-infância e semi-internatos públicos. Na escola as crianças primeiro aprenderiam a controlar seus desejos, depois desenvolveriam a coragem e, por fim, usariam a razão para alcançar o conhecimento.

- É na formação (educação das crianças) que vai ser decidido a que classe cada um pertence. O processo pedagógico é igual para todos e vai revelar que alma cada um possui. Quem tem alma de ouro vai receber educação filosófica, os demais devem parar nos estágios anteriores.

- Platão imagina que o Estado perfeito deveria ser dirigido por filósofos. A cidade ideal é aquela em que os filósofos são reis. Deve governar somente quem tem saber. Para Platão, o saber não está no mundo que conhecemos (SENSÍVEL). O verdadeiro saber está no mundo INTELIGÍVEL. No mundo inteligível residem as idéias (ex.: idéia de JUSTIÇA).

- Só os filósofos podem ascender ao mundo inteligível.

- Cidade perfeita = cidade justa = é aquela no qual cada um executa a sua função de acordo com a sua natureza. Impera a ordem e a harmonia. O fundamento da Justiça é inato ao homem, não é obtido por uma convenção. A cidade injusta é a que não respeita a ordem natural.

4.4 - Mito da caverna, presente na obra A República

- O que Platão nos mostra é o caminho que o filósofo percorre para alcançar o mundo das idéias.

- Assim como os habitantes da caverna mataram o companheiro, os atenienses mataram Sócrates, por ter colocado em dúvida as noções que eles estavam acostumados e por querer lhes mostrar o caminho do verdadeiro conhecimento.

- A alegoria demonstra a responsabilidade pedagógica e a coragem do filósofo, que já no caminho para o mundo das idéias se esforça para buscar seus companheiros, mesmo que isso lhe custe a vida.

- O mundo dos sentidos seria no interior da caverna e o mundo das idéias seu exterior.


15

- Para concluir, Platão não acha que a natureza seja mórbida e feia como o interior da caverna, mas entende que o mundo das idéias é muito mais perfeito e claro.

5 - ARISTÓTELES (384-322 a.C.)

- Considerado um dos maiores e mais influentes pensadores da cultura ocidental. Aristóteles foi provavelmente o mais erudito dos filósofos gregos clássicos ou antigos. Familiarizou-se com todo o desenvolvimento do pensamento grego anterior a ele. Em sua obra considerou, resumiu, criticou e desenvolveu ainda mais toda a rica tradição que herdara. É autor de grande número de tratados de lógica, política, história natural, física.

- Aristóteles é considerado por muitos o maior gênio da humanidade, sendo insuperável na sua capacidade de pensamento e construção intelectual. Suas teorias são aceitas até os dias atuais.

- Na Baixa Idade Média, os ensinamentos aristotélicos desapareceram da Europa, mas foram preservados na cultura árabe. Na Alta Idade Média retornam ao cenário europeu: o poeta italiano Dante chegou a dizer que Aristóteles é o “mestre dos que sabem”.

- Além de último grande filósofo grego, foi o primeiro grande biólogo europeu.

- É considerado por muitos como o fundador da Filosofia Ocidental.

5.1 - Aristóteles e as teorias de Platão

- Enquanto Platão achava que tudo que vemos ao nosso redor são reflexos do mundo das idéias e que só com a utilização da razão podemos adquirir conhecimento seguro, Aristóteles achava que o grau máximo de visão da realidade era alcançado através dos sentidos.

- Aristóteles concordava com Platão no fato de que as coisas do mundo dos sentidos se deterioram com o tempo, e que as idéias são eternas.

- Mas, para Aristóteles, as idéias (um cavalo, por exemplo) não passavam de um conceito criado pelo homem, ou seja, os homens viram as coisas (cavalos) e assimilaram a idéia de um modelo.

- Com isso, Aristóteles achava, diferentemente de Platão, que não existiam idéias inatas, ou seja, que nascem conosco. Para ele todas as idéias são adquiridas com a vivência.